Sinopse: «O nosso Dragão não devora as raparigas que leva, independentemente das histórias que possam ser contadas fora do nosso vale. Ouvimo-las, por vezes, de viajantes que por aqui passam. Falam como se estivéssemos a fazer sacrifícios humanos e como se ele fosse um dragão verdadeiro. Claro que isso não é verdade: ele pode ser um mago imortal, mas não deixa de ser um homem, e os nossos pais juntar-se-iam e matá-lo-iam se ele quisesse devorar uma de nós a cada dez anos. Ele protege-nos contra o Bosque e nós estamos-lhe gratos, mas não assim tão gratos.»
Agnieszka adora a sua pacata aldeia no vale, as florestas e o
rio cintilante. Mas o maléfico Bosque permanece na fronteira e a sua sombra
ameaçadora paira sobre a vida da jovem.
O povo depende do feiticeiro conhecido apenas por Dragão para
manter os poderes de Bosque afastados. Mas o Dragão exige um terrível preço
pela sua ajuda: uma jovem deve servi-lo durante dez anos, um destino quase tão
terrível como perecer a Bosque.
A próxima escolha aproxima-se e Agnieszka tem medo. Todos
sabem que o Dragão irá levar a bela, graciosa e corajosa Kasia, tudo aquilo que
Agnieszka não é, e a sua melhor amiga no mundo. E não há forma de a salvar.
Mas Agnieszka teme as coisas erradas. Porque quando o Dragão
chega, a sua escolha surpreende todos...
Conheci
este livro por acaso, numa ida a uma livraria. Nunca antes tinha ouvido falar
dele. Chamou-me a atenção a capa, mas mais a sinopse. É previsível – a escolha do Dragão surpreende todos;
está-se mesmo a ver o que vai sair daí – mas as figuras do Dragão e do Bosque
despertaram-me imenso interesse e curiosidade.
Logo
no início, comecei a gostar da escrita da autora. É rica e detalhada,
fazendo-nos transportar para o mundo que criou e fazendo-nos imaginar bastante
bem os ambientes e as personagens, tal como eu gosto. Achei engraçados os nomes
dos lugares do mundo – há um mapa no início do livro, coisa que eu adoro também
– e os de algumas personagens, pois remetiam muito para países como a Polónia,
a Croácia ou a Rússia, e eu supus que a autora tivesse raízes para esses lados –
basta olhar para o seu sobrenome, seja como for, e não me enganei neste
aspecto.
O
início, porém, não estava a cativar-me, mesmo tendo a história vários aspectos
que eu aprecio imenso, como a magia e o cenário mais medieval, com os seus
castelos, reis e aldeias. Especialmente porque tinha acabado de ler Trono de Vidro, que tinha adorado e, por
isso, a fasquia estava bastante elevada. Apesar de estar a gostar da escrita,
do mundo e da premissa da história, o início foi um verdadeiro tormento, e isto
devido às personagens.
Agnieszka,
a protagonista, era demasiado mimada, chegava a ser, até, um pouco tola, não
estava a demonstrar ser forte e era tão, mas tão desleixada e desastrada, que
já estava a chatear-me – tão diferente, portanto, da personagem principal do
livro anterior que eu tinha lido. Eu estava a ler e a pensar que era impossível
uma pessoa ser tão desastrada! A verdade é que, muito mais tarde, encontramos
explicação para esta deselegância, mas, na altura, não se consegue sequer
imaginar que exista uma explicação. É que é demasiado, e é mesmo impossível
alguém ser assim a esse ponto, mas fiquei contente por tal ser explicado. E,
depois, o Dragão. O Dragão também era irritante no início, porque era altivo de
uma maneira enervante e fervia em pouca água à mínima coisa, ao mínimo deslize
e ao mais pequeno desmazelo de Agnieszka.
No
entanto, isto foi apenas no início. Com o passar das páginas, comecei a
habituar-me a este temperamento do Dragão, embora continuasse a enervar-me, por
vezes, pois era demasiado. Não me habituei, contudo, ao desleixo de Agnieszka,
e só me conformei e me tranquilizei com este aspecto quando surgiu a tal
explicação para o seu desmazelo. Apesar disso, há uma agradável surpresa em
relação a esta personagem com o desenrolar da história: ela cresce imenso e
torna-se forte, confiante e corajosa.
Mas,
até certo ponto do livro, eu estava a arrastar esta leitura. Não estava a
cativar-me nada, e chegou a aborrecer-me e a fazer-me pensar quando é que a
história se tornaria mais interessante, pois não podia ser sempre assim. Porque,
quer dizer, o livro ganhou prémios e teve muito boas críticas. Não podia
limitar-se a uma história de confinamento entre duas personagens numa torre. Por falar nisso, estava a ser tão
estranho ler isto no início da pandemia e do estado de emergência do país,
pois, tal como eu estava fechada em casa, em isolamento, Agnieszka estava
fechada numa torre, sem poder sair, e a partir do Bosque podiam surgir seres
estranhos que transmitiam pragas ou doenças, que depois eram transmitidas para
outras pessoas. Quase como a nossa situação, de facto.
Só
lá para depois de umas cinquenta páginas é que a história começou a mudar um
pouco e a tornar-se mais interessante. E, a partir daí, uau. Foi como que uma
reviravolta, e tudo mudou. Aventuras começaram a surgir, novos lugares ganharam forma, a magia começou a
aparecer de uma forma fantástica, novas personagens entraram em cena, o Bosque
tornou-se mais real. E eu comecei a devorar o livro a partir daí.
O
livro tocou-me, em especial, devido à questão da magia. Era a magia na sua
forma mais “pura” e “ancestral”, se é que se pode dizer isso, pois incluía
lançamento de feitiços e livros de feitiços e poções e palavras mágicas e
outras coisas que tais, o que me fez pensar em Harry Potter, no porquê de
gostar tanto de livros de fantasia e nas minhas próprias histórias que eu
escrevi na adolescência, que foram inspiradas, precisamente, por HP e por estes
elementos. É “a magia que eu conhecia”, por assim dizer, e que eu achava que já
se tinha perdido e que já não se escreviam livros com estes aspectos. Eu adorei,
aliás, a forma como a autora descrevia o lançamento dos feitiços, tão
pormenorizado, indicando não só o que acontecia em redor, no ambiente após o
feitiço, mas também o que se verificava dentro da personagem, tudo o que ela
sentia enquanto invocava o feitiço, incluindo o modo como as palavras mágicas
fluíam, quase como um cântico. Foi-me impossível não imaginar e não ficar
fascinada com isto. Uma das minhas cenas favoritas do livro foi, de facto,
quando Agnieszka e o Dragão lançam um feitiço em conjunto para salvar outra
personagem. Para terem noção do nível de detalhes e da complexidade, esta cena
demora um capítulo inteiro. Umas dez páginas com a invocação de um feitiço. Pode
parecer aborrecido, mas é fantástico.
Outras
das minhas cenas favoritas são as que se passam no Bosque. O Bosque é como se
fosse o inimigo e ninguém sabe bem como isto acontece ou como surgiu, e é isso
que torna esta entidade tão interessante. Aliás, ter o Bosque, um mero conjunto
de árvores, como o inimigo e o mau da fita é realmente fascinante. As descrições
do Bosque são deliciosas; são tão ricas e sombrias, e, lendo-as, é como se
estivéssemos mesmo lá dentro.
E
houve, ainda, uma outra cena que me encheu de nostalgia: as personagens
reunidas no jardim de uma casa, com as crianças a correr no relvado e os
adultos sentados à mesa a conversar e a beber; só me fez lembrar os meus verões
numa casa de férias longe da cidade em família, em que eu e os outros miúdos
brincávamos na relva e os adultos estavam sentados lá fora a conversar entre
eles, como que dois mundos diferentes, até que, aos poucos, os mais velhos de
nós foram deixando de correr e de brincar na relva para também se sentarem com
eles. Tal como a nossa protagonista refere. Não consegui deixar de recordar
estes verões ao ler essa passagem.
Este
livro é um stand-alone, e eu estava
certa de que teria continuação, pois o final é muito em aberto e deixa algumas
questões no ar. Cabe, por isso, a quem leu imaginar o que terá sucedido a
seguir. Confesso que fiquei um pouco triste por saber que não teria
continuação, pois gostaria de ver mais algum desenvolvimento, mas talvez tenha
sido melhor assim. Às vezes, quando se insiste muito numa história, esta acaba
por perder a sua magia e o que a tornou tão interessante.
Apesar
do tormento inicial, este foi um dos livros que mais gostei de ler e que guardo
com um enorme e especial carinho no coração. Porque me mostrou um tipo de magia
que eu achava que já não existia. E isto deixou-me inspirada e motivada a
continuar a contar as minhas histórias de magia.
Vou adicionar à lista :)
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