Sim, 2020 foi um ano em que grande parte das pessoas regressou, literalmente, a casa. Ao espaço onde vivem. Atiradas para lá à força, impedidas de sair, obrigadas a lá permanecer o máximo de tempo possível. Fique em casa devia ser considerada a frase do ano. Para quem tinha a sua rotina de sair de casa para trabalhar e regressar ao final do dia, e mesmo para quem tinha que sair para cumprir outras rotinas e afazeres, ou para quem se viu forçado a trabalhar em casa sem saber para onde se virar ou como dar conta de tudo, acredito que tenha sido difícil.
No meu caso, no entanto, não houve um regresso literal a casa, porque, em casa, já eu estava. No espaço onde vivo, quero eu dizer. Houve, no entanto, um regresso à minha “casa espiritual”. Sinto que me reencontrei ao longo deste ano.
Sei, também, que a grande maioria das pessoas considera que este foi um ano deitado ao lixo, em que nada aconteceu, em que não fizeram nada. Eu também tinha os meus planos. Gostava de ter feito pelo menos uma viagem. Gostava de ter iniciado o meu negócio próprio. Entre outras coisas que a pandemia não deixou fazer. E, por causa disso e por ter sido, tal como toda a gente, forçada a ficar em casa, em vez de deixar que a incerteza em relação ao futuro e que a ansiedade e o medo de não saber o que poderia vir a acontecer me sufocassem e me sugassem toda a sanidade, eu voltei a minha atenção para outros aspectos.
Pus de lado, num cantinho da caixa de projectos futuros, para que pudesse resgatá-la mais tarde, no momento certo, a ideia do meu negócio próprio. Fi-lo porque focar-me nele no momento em que o mundo estava parado e num caos completo não fazia sentido. Iria apenas drenar a minha energia, porque eu não sabia quando poderia iniciá-lo, não quando tudo estava tão incerto: tudo estava fechado, toda a gente tinha que estar em casa, e não se sabia até quando.
Ter tido este tempo, para pôr essa ideia de lado – embora não tenha sido a primeira vez, mas devido a outros motivos – e para, consequentemente, focar-me noutras coisas, que realmente me importam e me apaixonam, foi como se me tivessem tirado um peso de cima, um manto pesado de ansiedade e de expectativas. Foi como se, finalmente, eu já não tivesse que ser a adulta licenciada que tem que começar a trabalhar porque assim tem que ser, mas sim como se pudesse ser a pessoa que quisesse. Podem bater-me ou dizer ou pensar o que quiserem, mas a verdade é que fiz muito mais neste ano atípico do que num ano “normal”, e não teria feito tudo o que fiz este ano se este, lá está, tivesse sido “normal”. Se não tivesse tido este tempo de pausa para também olhar para dentro, focar-me em mim própria, reflectir, reencontrar-me e reconectar-me com quem realmente sou.
Sim, é verdade que não viajei, que não comecei a trabalhar, que não fiz outras coisas. Que fiz planos que foram por água abaixo. Mas ter sido forçada ao isolamento e à quarentena permitiu-me focar no meu projecto artístico. Permitiu-me desenhar imenso, e também sonhar. Permitiu-me evoluir e melhorar, no que às artes diz respeito. Permitiu-me fazer diversas experiências, não só no que toca ao campo artístico. Fez com que começasse a cozinhar, que explorasse a culinária vegetariana, que experimentasse o ioga, que me desafiasse a manter uma rotina de exercício físico – ainda para mais em casa, sozinha –, que me tornasse mais organizada no sentido de planear melhor os meus dias. Fez com que me habituasse a ver-me de óculos e sem maquilhagem, e com que experimentasse novas formas de vestir e de conjugar as peças de roupa que tenho no armário, e isso, consequentemente, fez com que gostasse mais de mim a nível físico. Fez com que me focasse mais em coisas que me interessam e que posso controlar; fez-me dar mais valor a determinadas coisas, sobretudo a coisas que tomávamos como garantidas; fez-me ver que o amor vence tudo e que supera qualquer obstáculo; fez com que celebrasse mais as pequenas vitórias e os pequenos passos de todos os dias, por mais pequenos e aparentemente insignificantes que fossem; fez com que não pensasse tanto no futuro; fez com que procurasse por pedacinhos de alegria diariamente, coisas simples às quais não dava a devida importância. Sinto que adquiri um novo mindset durante este ano e que cultivei o amor-próprio, e que, devido a tudo isto, tomei diversas decisões, especialmente no que diz respeito a questões profissionais.
E por isso digo que tudo é uma questão de perspectiva. Porque, apesar deste ano atípico, caótico, incerto, em que nada do que se planeou se concretizou, em que tudo ficou virado do avesso,…houve coisas, coisas boas, que nunca teriam acontecido se o mundo não tivesse sido forçado a parar. Por isso, apesar de tudo – e apesar de terem existido dias em que só me apetecia mandar tudo para outro lado porque não estava a conseguir realizar nada do que queria nem concretizar nenhum dos meus planos –, e contrariando a opinião geral, este não foi um ano tão horrível assim, não foi um ano perdido e não foi, de longe, o pior ano da minha vida. E, apesar de tudo, agradeço, encontro coisas boas e foco-me nelas. Tenho a certeza de que, quem quer que esteja a ler isto, também terá coisas boas deste ano para celebrar e a que agradecer e dar valor. Há sempre.
Obrigada, 2020, por todo este “despertar”.
Há quem tenha tido um péssimo 2020 mas outros tiveram um ano fantástico, é normal. E eu fico muito feliz por 2020 ter sido tão bom para ti e acredito que 2021 será ainda melhor ♥♥
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