No início deste ano, comecei
um ritual. Peguei num pequeno caderno que estava abandonado a um canto, todo em
branco, e tornei-o no meu diário da gratidão. Todas as noites, salvo aquelas em
que estou terrivelmente cansada ou com uma dor de cabeça que não me permite
fazer nada, escrevo sobre as coisas boas daquele dia, aquilo que fiz e coisas
pelas quais estou grata. Ou, caso tenha sido um dia pior, escrevo algum
pensamento ou o que estou a sentir.
Muito se fala sobre o poder da
gratidão, como o facto de elevar a nossa frequência energética ou o facto de
nos tornar mais positivos, atentos, conscientes. Confesso que não acreditava em
nada destas coisas; achava que era tudo treta e passei, aliás, anos e anos sem
acreditar nestas coisas que não se vêem, como energias e forças superiores. Nem
sei bem de que forma o meu mindset
mudou e virou um pouco do avesso. Talvez por eu própria ter ficado virada do
avesso e já não saber mais em que acreditar, achando que não teria nada a
perder se desse a estas “filosofias” uma oportunidade.
Até me senti estranha no
início, ridícula, até, quando comecei a escrever o tal diário. No entanto, tem
sido um exercício muito interessante. Sempre fui uma pessoa negativa; era-me
muito difícil ser positiva e ver um lado positivo nas coisas. Mas este ritual
tem-me ajudado a focar-me nas coisas boas e a dar-lhes valor, especialmente a
coisas que costumamos tomar como garantidas.
Pode parecer ridículo
dizer-se, por exemplo, que estou grata por poder exercitar o meu corpo, por ter
tido a possibilidade de estar à beira-mar e ver o pôr-do-sol, ou por ter tido
um dia de trabalho. A mim também me parecia estranho, mas, agora, é-me natural.
Porque, se pensarmos bem, não são todas as pessoas que têm um corpo saudável e
que podem movê-lo e fazer exercício; não são todas as pessoas que podem ir
almoçar fora e que podem ver o mar todos os dias; e há muitas pessoas sem
trabalho, que não têm, sequer, a hipótese de, como eu, fazer pequenos trabalhos
de vez em quando. Por isso, estas coisas tão “parvas” e tão “banais” para
alguns podem ser, na verdade, privilégios.
Ao tomar mais consciência
destes aspectos tão banais do dia-a-dia, e que, por serem tão banais, não lhes
damos o devido valor muitas das vezes, tornou-se inevitável começar a dar um
especial valor a determinadas coisas durante este período de isolamento. Agora,
todas as noites, eu agradeço pela saúde e pelo facto de estar bem. Agradeço por
estar em casa, quando muitas pessoas não têm essa possibilidade e têm que ir
trabalhar na mesma, pondo as suas vidas em risco. Agradeço, aliás, por ter uma casa, em especial uma casa onde
eu adoro estar, onde me sinto segura e confortável. Agradeço por ter água
quente à disposição e comida na mesa todos os dias; por não me faltar nada.
Agradeço o amor e as pessoas que tenho comigo, mesmo estando elas fisicamente
longe; agradeço por estarem bem, por continuarem comigo, por saber que estarão
à minha espera para um abraço quando tudo isto passar. Agradeço a todas as
pessoas que continuam a trabalhar, e não só aos profissionais de saúde – é que,
quer dizer, quantas e quantas vezes não demos a devida importância àqueles que
trabalham atrás de balcões ou em caixas do supermercado?
Agradeço pela arte, que se
tornou imprescindível neste período. Para mim, é impensável um mundo sem
música, sem literatura, sem cinema, enfim, sem toda e qualquer forma de arte.
E, neste período em especial, a arte tem sido fundamental. No mínimo, ajuda-nos
a passar o tempo, mantém-nos entretidos e faz-nos companhia. Mas a arte é, para
mim, muito mais do que isso: dá-me força, ânimo, conforto, motivação,
inspira-me a fazer mais e melhor, faz-me sonhar. É como um bocadinho de magia
nesta realidade que se tornou terrível; umas pequenas centelhas luminosas no
negrume em que o mundo mergulhou. Encontro tudo isto nas palavras de bloggers e das pessoas que sigo no
Instagram, nos desenhos que essas pessoas fazem, nos livros e na música,
especialmente nas músicas novas que continuam a ser lançadas e partilhadas
nestas circunstâncias. E o acto de criar – no meu caso, desenhar e escrever –
também tem sido óptimo para mim, pois, para além de me manter entretida e de me
divertir, motiva-me a fazer mais e melhor e ajuda-me a manter a minha sanidade
neste período mais louco.
Por fim, agradeço pela
tecnologia, por nos manter próximos, mesmo que estejamos fisicamente distantes.
É que imaginemos que isto teria acontecido há quinze anos ou mais, quando não
havia smartphones ou videochamadas e
tínhamos um número limitado de mensagens por mês e um limite de X minutos
gratuitos de chamadas… Mas, em relação à tecnologia, não é apenas esta questão
de se poder manter o contacto e a proximidade; é também a partilha de mensagens
positivas e inspiradoras e a criação de uma corrente de optimismo, motivação e
esperança, como se puxássemos uns pelos outros.
Eu acho que não teria dado
tanto valor e tanta importância a estas e a várias outras coisas se não fosse
“obrigada” a pensar nisto todas as noites, no silêncio, imediatamente antes de
dormir. É um exercício que me tem ajudado bastante. Não apenas a focar-me no
positivo e a valorizar estas coisas aparentemente básicas e comuns, mas também
a fazer com que me sinta melhor. Começo, de facto, a sentir-me algo positiva e
a ver as coisas por outra perspectiva, sob um prisma de optimismo. Como com um
novo olhar. Achava uma parvoíce agradecer, até porque a primeira coisa que me
vinha à mente era Agradecer a quem?,
pois remetia-me logo para a religião, quando eu própria não me considero
seguidora ou praticante de seja o que for. Mas agora vejo que isto não se trata
de religiosidade ou espiritualidades nem nada que se lhe pareça. É, antes, uma
forma de ver as coisas, quase uma maneira de pensar ou de estar. Mas é
claro que, quem quiser, pode escolher agradecer a um qualquer deus. Eu cá
prefiro o conceito de universo.
Seja como for, achava uma
grande parvoíce, sobretudo nos primeiros dias em que escrevi. Mas, agora, é
algo que sai naturalmente quando pego na caneta e no caderninho. Agora,
acredito em como pode ser benéfico e poderoso.
É uma óptima ideia! Um dia tenho de experimentar e assim tenho um bom motivo para comprar um caderno fofinho ahah
ResponderEliminarEheheh ;P Experimenta, só faz bem!
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