Quando
publiquei esta fotografia no Instagram, a descrição que lhe atribuí
foi Happy place. Uma mesa, uma boa caneca de chá,
folhas em branco, lápis com fartura e música ambiente – esta é
uma combinação que me faz sentir bem.
Sempre
me disseram que, profissionalmente, eu devia fazer aquilo que
gostava. Sempre gostei de desenhar; sempre conseguia arranjar um
tempinho para o fazer, ainda que com pouca frequência, e sempre
tentei melhorar, aperfeiçoar e superar-me a mim própria neste
aspecto. Contudo, sempre tive, também, plena consciência de que
fazer disto a minha vida profissional estava bem longe do meu alcance
e que nunca daria certo, uma vez que eu, mais do que qualquer pessoa,
sou ciente das minhas capacidades enquanto “artista”.
Para
além do desenho, sempre gostei de escrever. Tal como no desenho,
sempre tentei melhorar. E, ao contrário do desenho, a escrita esteve
mais presente na minha vida, uma vez que era muito mais acessível:
bastava ter o meu computador por perto. Dediquei-lhe muito mais
tempo, escrevi contos e livros com todo o amor e dedicação,
participei em concursos literários e, durante estes anos do meu
“auge literário”, sonhava em ser escritora. De facto, se o
dinheiro não existisse ou não importasse, eu teria, sim, sido
escritora.
Mas
não pude ser. É muito bonito dizer que devemos seguir os nossos
sonhos e que devemos fazer o que gostamos, mas também precisamos de
sobreviver. Precisamos de sustento. Claro que existem paixões que
acabam por ter sucesso e dar sustento. Mas, infelizmente, isto não
acontece com todos.
Ultimamente,
e uma vez que me vejo forçada a procurar um novo emprego, tenho
pensado mais neste assunto. Em investir em algo de que goste
realmente. A investir em mim, ao invés de iniciar uma
aventura no primeiro emprego que me aparecer – correndo o risco de
acontecer o mesmo que aconteceu com este que acabei de deixar. Penso
em como gostava de ser daquelas pessoas que mudam radicalmente de
vida. Que tiram um curso, mas que acabam por seguir uma paixão e
fazem dela a sua vida.
Mais
tarde, contudo, estes pensamentos começam a cair por terra quando
começo a cavar o assunto mais a fundo. Licenciei-me numa área que
nada tem a ver com artes nem com escrita e que em pouco ou nada
estimula a minha imaginação e criatividade. É algo de que me
arrependo e que acho que não foi bem pensado e que acabou por não
ser uma boa decisão, mas uma pessoa é demasiado nova e tola quando
vai para a universidade e mal sabe o que anda a fazer e o que quer da
vida – à excepção daqueles prodígios que já têm uma grande
maturidade e uma determinação do caraças ainda antes de chegarem à
universidade e que eu invejo de morte. No entanto, apesar de tudo
isto, foi uma decisão minha – que contou com interferências
externas, mas adiante –, e, por isso, tenho que ser responsável
por ela e arcar com as consequências. Para além do mais, acabo por me lembrar do quanto investi nisto. Não em termos financeiros, sem querer descurar
essa parte. Mas em termos de tempo, de paciência, de energia. Nos
sacrifícios que tive que fazer. Talvez não seja algo a abandonar
completamente. E talvez a questão de mudar de
vida também não seja para todos.
Continua na próxima publicação.
a mudança parece vir com todo um vestido preto, com uma voz forte e formas ruins de falar por trás. no entanto, na minha opinião, opinião de quem estava no último ano de um curso com emprego praticamente garantido (e a ganhar bem) na área das ciências para voltar para o 1º ano de um curso de artes, não há nada melhor e mais libertador do que fazermos aquilo que gostamos realmente. claro que, tal como dizes, temos de sobreviver e, portanto, temos de ter consciência naquilo que fazemos - embora uma certa inconsciência também seja benéfico. mantém os pés no chão mas não desistas do que realmente queres porque há SEMPRE maneiras de lá chegares, mesmo que vás por outros caminhos e que demores mais tempo que todas as outras pessoas. não percas tempo a pensar no "e se...?" :)
ResponderEliminarNo outro dia despedimo-nos de uma colega que ia iniciar o seu estágio na ON mas que, uma semana antes do início oficial, foi tomada por um sufoco e disse que não aguentava mais fingir que era aquela pessoa, que queria fazer aquilo, que queria investir mais tempo e dinheiro em algo que cada vez mais a deixava aflita por a arrastar para um caminho para o qual não se identificava. Candidatou-se para Artes e vai começar tudo de novo, contra todos os comentários e sugestões para que repensasse. Fez-me confusão porque ninguém se apercebeu que ela não decidiu ir para Artes naquela semana. Nem era por medo da ON. Ela decidiu ir para Artes ao mesmo tempo que se candidatava para o nosso curso. O único acto impulsivo que aqui estava foi o timing com que decidiu fazê-lo, nada mais. Não fui capaz de dizer nada, apenas a abracei e disse que estava do seu lado, porque era o lado que a fazia feliz.
ResponderEliminarNão sei qual é o desfecho e gostava de terminar este comentário com uma conclusão super empoderadora como tem sido tendência nos últimos anos quando se trata de, como dizes e muito bem, mudar de vida. Mas sinto que uma coisa ninguém lhe tira: o sono. A consciência tranquila na hora em que se deitar e pensar 'era a hora certa para o fazer'. Só por isso, eu já a considero um caso de sucesso.
Às vezes olhamos para as nossas formações e caminho como uma prisão que nos sufoca e não tem de ser assim. Também sou criativa e Nutrição não me dá esta liberdade, mas não acho que mudar de caminho seja uma perda de investimento. O nosso curso é tão rico em aprendizagens para a vida que eu sei que fiz a escolha certa. Quis aprender isto. Se vou fazer disto a minha vida? Ainda não sei, mas estou de coração aberto e não permito que nada no mundo me algeme. E a partir do momento em que temos esta visão, esta coragem para aceitar que investimentos não são eternos, que a nossa formação não nos tem de prender em um lugar, conseguimos olhar para os nossos caminhos sem tanto desespero e com maior sensatez. Temos tanta vida pela frente e para nos descobrirmos. Vamos encontrar o nosso lugar :)