Eu
sei.
As
pessoas sem sonhos, por não terem sonhos, vivem sem pensar a longo
prazo. Sem pensar “para a frente”. Ou melhor, o único pensamento
que têm “para a frente” tem a ver com a sua reforma. Pensam no
quanto falta para a reforma. De resto, não pensam a longo prazo. Não
pensam num amanhã, já que o amanhã será igual ao hoje. E isto
porque não têm um objectivo a longo prazo, um sonho pelo qual
lutar. Vivem um dia de cada vez, embaladas na sua rotina. Pensam no
que têm que fazer a seguir – conduzir para o trabalho ou apanhar
um transporte público, fazer as compras para a casa, fazer o jantar,
fazer as tarefas domésticas; enfim, fazem aquilo que é preciso e
que tem que ser feito. Eventualmente podem planear umas férias ou
umas remodelações em casa, mas pouco mais. Não digo que vivam
apáticas, mas sim que vivam sem pensar muito para além do que tem
mesmo que ser feito para sobreviverem. É isso: vivem para
sobreviver. Mas algumas dessas pessoas até são felizes assim.
Talvez por a sua situação ser estável e confortável. Por acharem
que é mais fácil viver assim do que com sonhos.
As
pessoas sem sonhos podem não ter sido sempre assim desde o início. Podem
ter nascido com sonhos, mas esses sonhos podem ter-se perdido ou
morrido ou terem-lhes sido roubados ao longo do caminho. Devido às
circunstâncias da vida, devido à rotina de sobrevivência que as
embalou num abraço confortável, ou devido a pessoas que não as
apoiaram na sua luta e lhes disseram que não seriam capazes.
Eu
já tive sonhos. Lembro-me de tê-los tido.
Mas morreram.
Um
deles talvez não tivesse sido realmente um sonho, pois desisti dele
logo ao primeiro obstáculo e não quis continuar a lutar. Talvez não
o tivesse querido mesmo. Um outro manteve-se durante mais tempo, até
começar a desvanecer-se aos poucos devido à rotina de
sobrevivência. Talvez não tenha morrido completamente e esteja
apenas em estado de latência, à espera de um estímulo que o faça
expressar-se de novo.
Seja
como for, eu já os tive. Não sinto que tenha algum agora. Gostava
de ter um. É possível isto, que nos forcemos a ter um sonho?
É
que é tudo tão mais fácil quando se tem um sonho. Porque, ao
tê-lo, sabemos o que queremos. Sabemos o que podemos e devemos fazer
para o alcançar. Vivemos com esse objectivo, e com a esperança de
que a vista seja linda quando chegarmos ao topo da montanha que nos
propusemos subir. Porque, sim, também é tudo mais bonito quando se
tem um sonho.
As
pessoas sem sonhos ficam pelo chão, e algumas até nem se importam
com isso, desde que (sobre)vivam felizes, estáveis e agradavelmente
na sua pequena zona de conforto.
Mas
há outras que se importam: aquelas para quem o chão não as faz
felizes. Podem estar seguras, estáveis e confortáveis, a sobreviver
sem grandes preocupações. Mas falta-lhes o mais importante.
Falta-lhes sentirem-se felizes.
Acredito
que um sonho as faria felizes. A mim, faria.
Porque
um sonho daria sentido à vida, quando mais nada parece dar sentido.
Um sonho daria algo pelo que lutar, quando não há mais nada digno
de luta. Ir atrás de um sonho e concretizá-lo traria alegria,
quando mais nada é capaz de a trazer.
E
os dias não seriam apenas sobrevivência. Seriam o caminho para algo
maior, melhor e feliz.
O sonho comanda a vida, não é assim?